quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Odun Òrísá


A data de hoje tem a máxima importância na minha vida. Há exatos 19 anos, fui escolhida por mãe Òsún para ser uma das suas representantes aqui no Áiyè. Provavelmente, não sua melhor representante... Mas, é inevitável dizer que tenho me empenhado em dar o meu melhor, embasada em uma fé que foi sendo construída ao longo desses anos como sua omo-òrìsá, onde sou agraciada e testemunha do seu imenso poder. A vós, minha mãe, só tenho a agradecer por me escolher, por me resgatar, por ser grandiosamente plena na minha vida, por ditar regras e diretrizes, por comandá-la com pulsos fortes, me encaminhando e me transformando a cada dia, em uma pessoa melhor, convicta da minha predisposição e responsabilidade em continuar trilhando o meu caminho em cumprimento de minha missão espiritual, mesmo sendo sabedora, que tal caminho é árduo e penoso, porém, tendo a certeza que estará sempre junto a mim, todas às adversidades serão superadas e vencidas!
Minha mãe delicada, a ti pertence toda minha vida! Conceda-me sempre a sua doçura, seu encanto, seu brilho, sua fertilidade, sua astúcia, sua determinação, sua beleza e todos os seus atributos. Fazei com que eu desempenhe um bom papel com vossa representante, honrando sempre o seu nome; favoreça-me na minha conquista da riqueza espiritual, tendo sempre como base, os seus ensinamentos como meu esteio e princípio.
Não me deixe faltar, minha doce mãe, o amor, a prosperidade, a saúde, os bons amigos, a ternura, os bons filhos, a família, o bom coração, a candura, o trabalho, a humildade, a docilidade e a resignação.
Livrai-me minha mãe, de tudo que for nocivo, impuro e insalubre! E se possível, minha doce mãe, me conceda mais tempo... Mais tempo para continuar a viver, tempo para continuar a lhe venerar, tempo para aprender... Tempo para ensinar... Tempo para reaprender... Tempo para tentar fazer melhor... Tempo para poder lhe agradecer, o quão verdadeiramente, sou grata por fazer parte de vossa escolha.
Aproveito para agradecer as pessoas que participaram de cada momento da minha vida espiritual, porque embora não fazendo mais parte do mesmo caminho, não poderia desmerecer e nem renegar as minhas origens. Reconheço e peço abenção pelo dia de hoje, a minha mãe Yànsán, minha navalha e meu orgulho, sempre constante na minha vida como grande mãe e protetora!
Agradeço aos meus filhos ausentes pelo aprendizado que com certeza me deram, mas e principalmente, aos meus filhos presentes, que além do aprendizado que acrescentam à minha vida espiritual, vivencio a demonstração diária de fidelidade, respeito, amor e dedicação a mim e a mãe Òsún. Agradeço também, aos bons amigos que fiz nessa empreitada, onde sempre pude contar com a ajuda, o companheirismo e acima de tudo, com o respeito.
Meu agradecimento em especial, ao meu Bábálòrìsá Otavio de Omolú, pessoa que vem conseguindo, reavivar e resgatar dentro de mim, o quanto é importante e necessário possuir uma família de àsè. A pessoa que vem me ensinando que "acolher" é muito mais importante do que "parir". E que filhos não legítimos, podem sim... Ter o seu valor e a sua importância, pois todos somos filhos de Òrìsá, e essa é a única legitimidade necessária. Não tenho a menor dúvida, que foi mãe Òsún que o colocou no meu caminho, e não tinha momento mais oportuno, pois já não alimentava mais esperanças... Mas, como aprendi que o tempo de Òrìsá nunca é o nosso... Aqui estamos nós... E eu me empenhando a fazer dessa nova oportunidade, uma experiência única e definitiva. Só desejo saúde e que meu pai Omolú e minha mãe Òsún abençoem e eternizem essa união! Sua abenção, meu pai Otavio!! Muito bom tê-lo junto a mim!
Findo esse depoimento, agradecendo muito mais do que pedindo... E reiterando:
Òsún, minha mãe...
sem vós, eu não chegaria a lugar nenhum.
Obrigada por ter me ajudado a chegar onde estou hoje.
Mo jùbá Ìyá mi Òsún! Emi fé Okan Ìyá mi Òsún!

Àwùre aos meus Àgbá,
Àwùré aos meus Egbomis e
Àwùré aos meus Aburos!
Que Ìyá mi Òsún continue a zelar por todos nós!
Ore Yeye O!!! Òsún gba mi O!


quarta-feira, 21 de março de 2012

Mais uma baixa de peso no nosso Candomblé!

Egbomi Cidália de Iroko
Ontem o mundo do Candomblé ficou mais triste. Durante a manhã faleceu, no Hospital Naval em Salvador, por complicações derivadas de um problema renal, a ebomi Cidália Soledade, 82 anos. Filha de Iroko, o orixá que habita a gameleira e domina os mistérios da vida e da morte, foi consagrada por Mãe Menininha dos Gantois. Ela deixa os filhos Elizabeth, Raimundo, Eliana e Josenice.

Ebomi Cidália tinha 75 anos de consagração à religião dos orixás. Era dona de um grande carisma. Ficou conhecida pela sabedoria e capacidade de transmitir conhecimento numa linguagem que era facilmente absorvida pelo público a quem se dirigia. Por conta disso recebeu do professor Jaime Sodré o título de “Enciclopédia do Candomblé”.

Com saber reconhecido em uma religião que tem como uma de suas fortes marcas a tradição e a oralidade estava sempre atenta a conhecer mais de perto tudo que surgia de novo no campo da comunicação.

Uma das suas atividades preferidas era conversar com jornalistas e pesquisadores de outras áreas. Costumava dizer: “Não tenho medo de conversar com jornalistas, antropólogos e historiadores, pois eles não vem buscar fundamento do candomblé, o que eu nunca revelaria. Eles vem buscar informações que ajudam a esclarecer sobre a religião”.

Aos 78 anos, descobriu as redes sociais com o Orkut onde mantinha uma comunidade para diálogo intenso com admiradores espalhados pelo Brasil inteiro. Com a ajuda de um dos seus amigos, o taxista Romilson Costa, ela fazia, diariamente, a atualização da sua rede respondendo mensagens. Nos ultimos dois anos andava interessada em conhecer mais sobre outras ferramentas como blogs.

O sepultamento será hoje, quarta-feira, às 15 horas, no Jardim da Saudade.
Texto gentilmente cedido por Roger Santos do Grupo Cultura Mais que Sagrada no Facebook
https://www.facebook.com/groups/culturamaisquesagrada/206069222831638/?comment_id=206071912831369&notif_t=like

segunda-feira, 19 de março de 2012

Pedido de Doação


Nós do Ilè Asè Yeye Kàrè ati Deuiy - uma Instituição Religiosa, sem fins lucrativos,  acreditamos que o Candomblé que é uma religião de confraternização, de valorização da família, tem a responsabilidade com o compromisso social, e por estarmos engajados na implantação de um projeto social que beneficia e ampara pessoas da “melhor idade” dentro dos cultos de religião de matriz africana, vimos expor o seu conteúdo.

O referido projeto consiste em:
  
  • Cadastrar esses idosos (pessoas da melhor idade) dentro das comunidades de terreiro em parceria com o mutirão de legalização das comunidades de terreiro do Estado do Rio de Janeiro (Coordenado pela Profa. Valeria Teixeira do Centro Cultural Agué Marê); 
  • Identificar entre os idosos os portadores de necessidades especiais;
  • Promover amparo quanto à garantia dos direitos de cidadania;
  • Promover capacitação dos mesmos;
  • Reintegrar no contexto sócio religioso;
  • Aproximar, integrar e promover a interação de jovens adeptos com os idosos da religião, resgatando assim, a troca de experiência entre as gerações;
  • Possibilitar o resgate e preservação das memórias e vivências desses idosos dentro das suas casas de Asè; 
  • Promover visitação periódica com o objetivo de suprir possíveis carências afetivas, autoestima, proporcionando assim, bem-estar.

Para tanto, amigos, estamos buscando parcerias e parceiros com outras organizações para desenvolver amplamente esse projeto que é o nosso principal objetivo.

Resolvemos então, pedir ajuda aos amigos das redes sociais, e contar com a solidariedade e a colaboração dos inúmeros amigos que acessam esse blogger, externando a nossa dificuldade de completar as cestas básicas, pois formalizamos parceria também, com a Casa de Caridade e Fraternidade Francisco de Assis e Frei Luiz em Honório Gurgel, que beneficia uma comunidade de catadores do bairro principalmente Barreira e Proença, que são favorecidos com entrega de cestas básicas e um sopão distribuído sempre na última quinta-feira de cada mês.

As crianças, os idosos e os especiais carentes contam muito com essa ajuda mensal, pois, a carência é grandiosa, se não puderem, doar uma cesta completa, doe um dos itens da cesta, pois um quilo de alimento faz muita diferença na mesa dessas pessoas.

Itens da CESTA BÁSICA:
2 kg arroz / 1 kg feijão / 1 kg fubá / 1 kg sal /  1 kg açúcar / 1 kg macarrão / 1 kg farinha de mandioca / 500  g café /  1 cx polpa de tomate / 1 lt leite em pó / 1 lt sardinha / 1 cx gelatina /  1 pct achocolatado / 1 pct biscoito /  1 l óleo


* Contatos:
casacaridade@hotmail.com – Dirigente: Mary Lane – 
tel: (21) 3373-6335
ileyeykareatidei2@hotmail.com – Ministra Religiosa: Ìyá Elaine ti Òsún – tel: (21) 9493-3848

Agradecemos de coração sua generosidade!

“Faça todo o bem que você puder,
por todos os meios que você puder,
de todas as maneiras que você puder,
em todos os lugares que você puder,
todas as vezes que você puder,
para todas as pessoas que você puder,
sempre e quando você puder.“


domingo, 18 de março de 2012

A terapia das ervas



Diz o velho adágio popular que "Deus dá o mal e também dá o remédio para este mal". Nunca algo foi tão bem dito e definido como esse ditado. 
É costume nos rituais afro-brasileiros dizer-se que "sem as ervas, não existiria Òrìsá, e, sem Òrìsá não existiriam as ervas". O estranho encantamento que as folhas, as raízes e as ervas exercem dentro dos rituais do Candomblé é assunto fascinante e desafiador para quem acredita em algo mais do que aspirina.
Recentemente, a Organização Mundial de Saúde reconheceu em público os valores terapêuticos de uma erva brasileira conhecida como Quebra-pedra, classificando-a como o melhor remédio para as doenças dos rins. No entando, essa mesma erva é usada há mais de duzentos anos pelos praticantes do candomblé para o mesmo objetivo e com resultados fabulosos. Os chamados países de Primeiro Mundo discutem a biodiversidade, tendo por objetivo a potencialidade da flora brasileira, enquanto o Brasil, com a inocência de uma criança que acredita em "Papai Noel", espera algum ato honesto por parte deles.
É comum nos rituais afro-brasileiros a identificação de ervas, folhas, frutos e raízes com os Òrìsás e o consequente uso delas nos rituais dedicads a estas divindades, bem como nos males físicos que porventura venham a ocorrer.
Assim, o Tapete-de-Oxalá, conhecido também por Boldo, é usado nas oferendas para Òsáàlá e nos problemas estomacais, pancreáticos, de vesícula e bílis.
No entanto, os virus e bacterias se desenvolveram  e tornaram-se cada vez mais resistentes, exigindo produtos cada vez mais fortes, e a nossa inocência ante a própria natureza que nos cerca propiciou a chegada do vírus hospitalar e a Aids. Resta-nos apenas uma saída: saber que, se não somos Deuses, somos pelo menos um pouco Deles em cada um de nós...basta apenas adquirir um pouco da Sua infinita sabedoria para que tenhamos a certeza de que a Natureza dá o Mal, mas também dá o remédio para esse mal. Basta crer e pesquisar! Pois afinal de contas, as ervas pertencem aos Òrìsás e são um presente da natureza para o Homem.

Fonte: Dicionário Antológico da Cultura Afro-Brasileira de Eduardo Fonseca Junior

Nome Popular: Quebra-Pedra
Principais Substâncias: Alcalóides
Nome Cientifico: Phyllanthus acutifolius
Outros nomes: Phyllanthus niruri

Caracteristicas

Erva rasteira, de folhas pequenas verdes-azuladas, muito popular em todo Brasil. Cresce em solos duros. Seu nome se deve ao fato de ser usada nos casos de pedras nos rins. Possui ação analgésica e relaxante muscular.

Observação

abortiva e purgativa em dosagens acima das normais.

Utilidades

Excelente diurético e elimina cálculos renais. Ácido úrico, anúria, ascite, artrite, beriberi, colecistite, derrame (AVC), diabete, urétra.

Forma de Uso

Planta inteira com raiz.
Fonte: www.useplanta.com.br


Nome Yoruba: Ewe bàbá
Nome Popular: Bodo, falso boldo, tapete de oxalá...
Nome científico:Colus barbatus Benth.,
Orixa:Oxalá


sexta-feira, 16 de março de 2012

O Julgamento Divino

ÌDÁJÓ TI OLÓRUN - O JULGAMENTO DIVINO


Há um lugar definido, fora desta terra, para onde os falecidos vão. O nome utilizado para este lugar é Òrun que, num sentido geral, significa Céu, o lugar onde Olódùmarè, os Òrísàs e  os espíritos diversos habitam. A denominação de todos esses habitantes do Òrun é "araòrun", cuja principal diferença entre eles e os "araàiyé", habitantes da terra, é a de que aqueles não necessitam do "èmí", a respiração, para sobreviver, no dizer de J. E dos Santos  “o òrun é todo espaço abstrato paralelo ao àiyé; outros alegam que o òrun é muito longe,  sendo pôr isso que o recém – morto tem que adquirir energia, consumido a comida e a  bebida oferecidas durante as cerimônias fúnebres, antes da ida para a longa viagem. Para  uma conclusão lógica da localização do òrun, devemos nos fixar no seguinte: se Olódùmarè  é a origem desta alma que continua a viver depois da morte, ela forcosamente irá regressar  à sua origem. O òrun é dividido em outros tantos espaços para acomodar todos os tipos de  espíritos. São em número de nove, segundo as tradições, embora tenhamos conseguido relacionar apenas oito, com denominações diversas e condizentes com suas finalidades: "Òrun Rere", o bom lugar, para aqueles que foram bons durante a vida: "Òrun Àlàáfíà", o local  de paz e tranquilidade; "Òrun funfun", òrun do branco e da pureza; "Òrun Bàbá Eni", o òrun do  pai das pessoas; "Òrun Aféfé", o espaço da aragem, local de correção, onde os espíritos  permanecem e tudo é corrigido, e lá ficarão até serem reencarnados; "Òrun Ìsàlú ou Àsàlú",  local onde são realizados os julgamentos; "Òrun Àpàádi" o òrun dos “cacos”, do lixo celestial,  das coisas quebradas, impossíveis de reparar e de serem restituídas à vida terrestre através  da reencarnação; "Òrun Burúkú", o mau espaço, quente como pimenta e destinado às  pessoas más. Alguns dos òrun relacionados se equivalem pela finalidade que possuem, os mortos são encaminhados a um desses espaços após o fator decisivo do julgamento divino, pois, na realidade, o julgamento ocorre durante todo o tempo de vida da pessoa na terra.  As divindades contrárias ao mal acompanham as pessoas em sua vida diária e dão a sua punição; o juízo final fica a cargo de Olòdùmarè, decidindo quais são os bons e quais são os  maus, e os encaminham para os respectivos òrun. O julgamento é baseado nos atos praticados na terra e devidamente registrados no orí inú, que retorna para Olódùmarè. A maneira como é feito julgamento pode ser entendida através do seguinte provérbio:
"Todas as coisas que fazemos na terra
Damos conta, de joelhos no céu".
Somente quando se é absolvido pôr Olódùmarè é que se tem a oportunidade de reunir – se com seus ancestrais, podendo – se reencarnar e renascer dentro da mesma família. Se alguém porém é condenado vai para o Òrun Àpáàdi, onde irá sofrer com maus. Quando finalmente for libertado, não terá oportunidade de viver uma vida normal e será condenado  a errar, pôr lugares solitários, comendo alimentos intragáveis. Isto é lembrado em trechos de palavras de despedida a uma pessoa que morreu:
"Não coma centopéias
Não coma vermes
Coma as coisas boas que ele comem no céu
Coma com ele"

Fonte:Bibliografia - Livro: Òrun Áiyé
Autor: José Beniste
Editora Bertrand Brasil



Evento - I Encontro de Articulação e Mobilização dos Povos de Terreiros

Contamos com a presença de todo Povo de Santo!!!

quinta-feira, 15 de março de 2012

Os Deuses não dispensam o Obi

Ebora kì ìko èbè fún Obi. (As divindades nunca desconsideram uma súplica feita com Obi).


Significado de Obi

O Obi que é um fruto africano de uso imprescindível no Candomblé, sem ele nenhuma obrigação é feita.
Para que a obrigação, ou outro rito prossiga com aceitação dos Òrísás é necessário uma resposta positiva a ser dada através do Obi.
Ele deve ser jogado antes da obrigação para saber se o ritual pode ser realizado e depois de feito para saber se foi aceito pelos Deuses.

O fruto utilizado deve ser o que possui quatro gomos, chamado de Obi Abatá, sua divisão deve ser natural, ou seja é proibido o uso de faca ou qualquer material cortante, para dividi-lo em quatro partes, se naturalmente ele só contiver duas partes.
As duas metades correspondem a dois casais, caso o Obi contenha mais de quatro partes, o excedente deve ser retirado, para que somente as quatro permaneçam.
O local onde o Obi será lançado deve ser plano, no chão ou sobre um prato branco, onde fundamentalmente contenha água.
As partes são lançadas simultaneamente, sem manipulação ou lançamento individual.
Uma exceção deve ser feita no uso do Obi como jogo, para o Òrìsá Sàngó deve ser utilizado Orogbò em substituição ao Obi.

O fruto dessa árvore tem uma dimensão tão importante no Candomblé que sua utilização vai desde os rituais de iniciação até a consulta, por meio das suas sementes, para saber se determinada oferenda agrada às Divindades. Em tempos de urbanização acelerada, em que os terreiros têm sua áreas verdes reduzidas ou sob constante ameaça de perda, ter Obi nessa quantidade é uma grande vantagem.

O Obi é muito usado nos boris, que são rituais ligados à iniciação no culto. “A planta é usada na oferenda e no ritual de cabeça para o feitio de orixá. É também um ótimo remédio”, explica mãe Odete, destacando uma característica marcante do uso das ervas no Candomblé: a função das plantas não é apenas ritualística, mas também medicinal.

A importância delas é por unir o tratamento espiritual ao cuidado do corpo, pois, no entendimento das religiões de matrizes africanas, são ações que caminham lado a lado. 

Fruto do corpo e do espírito
O Obi é uma planta africana que, como muitas outras, veio para o Brasil por necessidades do culto. É consagrado a Òsáàlá. Saber a quem ele é dedicado já é uma pista para conhecer sua função, não só ritualística – iniciação e adivinhação – mas também medicinal. Na indicação popular ele é tido como estimulante físico e de fertilidade.

“Òsáàlá é o grande Pai de todas as outras divindades. Ele é filho de Olorun, o Deus Supremo. É a ligação entre ele, os outros Deuses e a humanidade”, explica o antropólogo, chefe do Departamento da Ufba e ogã da Casa Branca, Ordep Serra.

Dentre as espécies catalogadas, encontra-se o obi, cujo nome científico é Cola acuminata. “O obi tem como princípio ativo a cafeína. O teor dessa substância varia muito. Daí por que ele é usado em processo de iniciação, quando se dá uma importância grande aos conhecimentos traduzidos de forma oral ao qual é necessário manter-se atento, em vigília”, explica Eudes Velozo, doutor em química orgânica, professor de química farmacêutica na Faculdade de Farmácia da Ufba e um dos coordenadores do Projeto Ossain.

A massinha branca que reveste a semente do obi é rica em açúcares. “Esse tipo de experiência nos mostrou o quanto há de sabedoria nesse conhecimento dos terreiros. Exercer o conhecimento das ervas é um cargo no Candomblé em que não é necessária apenas a habilidade mística, mas também o estudo”, acrescenta Velozo.

Um outro aspecto notado pelos pesquisadores é a individualização dos tratamentos, coisa que Velozo diz que a medicina tradicional, a partir da genética, passou a utilizar. “A medicina já reconhece que um remédio não tem necessariamente a mesma eficácia em todas as populações. E isso o povo-de-santo já sabe há muito tempo. A planta que serve para uma pessoa numa determinada situação, não vai necessariamente ser utilizada por outra do mesmo jeito”, diz. Esses cuidados, inclusive, fazem parte de um preceito caro ao povo-de-santo: "a mesma erva que pode salvar, se usada indevidamente, pode matar."

Obi, obi d’água ou simplesmente obi. Todos estes nomes referem-se à mesma obrigação, voltada exclusivamente a confortar uma pessoa em um caso de doença, desemprego, distúrbios nervosos, ou até mesmo para um iniciado dentro dos preceitos do "Asè Òrìsá", quando por um motivo ou outro, o mesmo não pode passar por um bori. Esta obrigação tem seu nome em referência a uma fruta africana, o obi, sem a qual nada podemos realizar para os òrìsás, no tangente a sacrifícios, uma vez que é com ela que conversamos com nossos antepassados para sabermos se aquele santo está satisfeito com a obrigação, etc.

Esta obrigação é a mais simples realizada dentro do asè, no tangente a dar de comer a uma cabeça. Muito embora algumas pessoas achem que ela não tem maiores fundamentos junto com o Òrìsá, mas já presenciamos muitos casos que foram resolvidos com esta. Trata-se neste ato, de confortar o anjo da guarda da pessoa, seja consulente ou filho de santo, ocasião onde alimentamos Òsàálá, no intuito de pedir a misericórdia para aquele filho que se encontra em tal sofrimento.

Claro que esta obrigação não cria uma obrigatoriedade do cliente com o santo, ela apenas serve como um modo de resolver de imediato uma questão. Existem aqueles que após o obi, sentem-se tão felizes que optam por penetrar de forma mais profunda dentro de nossa religião.

Antigamente quando uma pessoa desejava entrar para os preceitos de uma casa, ou seja, ser filho ou filha de santo naquele templo, ou mesmo quando seu òrìsá exigia feitura, os zeladores tinham por hábito realizar esta como uma primeira obrigação, para daí então estudar a pessoa, ver se ela realmente tinha amor e dedicação para com os òrìsás, e até mesmo para se certificarem de que era realmente sua casa e sua mão que aquele santo desejava, e não apenas uma empolgação material ou espiritual. Agiam assim, pois que, nesta época não existia o fato de uma pessoa fazer santo com um e tomar obrigações com outro, provocando um rodízio ridículo nas roças de santo como as que se vê hoje em dia.

Para uma pessoa se iniciar, existia todo um processo de identificação dele com a casa e vice-versa. Era uma época em que a fidelidade de um iniciado era realmente levada a sério, assim como a do sacerdote com relação a seus iniciados. E o obi, era justamente a obrigação que funcionava como uma espécie de flerte, vulgarmente comparando, evitando constrangimentos futuros.

Hoje em dia, parece que esta fidelidade simplesmente evaporou-se com a fumaça dos defumadores, pois que uma pessoa se inicia em uma casa e quando desencarna, traz uma longa passagem de terreiro em terreiro. Claro que ainda existem aqueles que prezam a fidelidade, mas são bem poucos nos tempos atuais.

Ser um iniciado é antes de tudo sermos fiéis a mão que alimenta nosso òrìsá, nosso anjo da guarda, assim como "Ele" é fiel a nosso zelador. Pertencermos ao asè òrìsá é antes de tudo sermos humildes, desprovidos de arrogância e soberba, é seguirmos nosso destino na certeza de que um ser tão puro e iluminado se dedica a zelar por nós e nossa vida.

OBI ABATA - TERMINOLOGIA

Na Diáspora a palavra “obi” pode significar muitas coisas diferentes para muitas pessoas diferentes.

A NOZ DE COLA

0BÌ FRUTO DE UMA PALMEIRA AFRICANA (COLA ACUMINATA, SCHOTT. & ENDL. – STER-CULIACEAE) ACLIMATADA NO BRASIL. INDISPENSÁVEL NO CULTO DOS ORISÁ, ONDE SERVE DE OFERENDA PARA OS ÒRÌSÀ E É USADO NAS PRÁTICAS DIVINATÓRIAS SIMPLES, SEPARADO PELAS MÃOS EM PEDAÇOS.
O BROTO DO OBÌ: TIRA-SE PARA IMOBILIZAR A GERMINAÇÃO. PARA UM OBÌ GERMINAR É PRECISO DE TODAS AS SUAS PARTES. SE ISTO É OBSTRUÍDO, É NECESSÁRIO NÃO DEIXAR OS GOMOS EM INCUBAÇÃO. UM GOMO ESTÁ SEPARADO DO CONJUNTO. SERIA MAIS OU MENOS UM PADECIMENTO. POR ISTO QUE DIZEMOS: PA OBÌ,  (MATAR O OBI).

A palavra “obi”, se refere à noz de cola fresca nativo da África, especificamente o OBI ABATA. Varia de branco, a escuridão vermelho, em cor.

Embora possam ser usadas outras configurações do Obi de vários modos, são os quatro lóbulos de Obi, também conhecido como Iya Obi (A Mãe Obi).
 

DIFERENTES TIPOS DE NOZES DE COLA
1. Obì – Noz de cola Acuminata. Obì e água (obì omi tùtu) são oferendas primordiais nos cultos afro-descendentes.
2. Obì àbátá ifin – Obi 4 partes branco - Oferenda exclusiva de Obatalá.
3. Obì abatá pupa – Obi vermelho. Serve de oferenda para qualquer ebora que não seja fun-fun, inclusive para Orí e Egun.
4. Obì edun = obì àáyá – (Cola Caricofolia– Sterculiáceae) – Cola de macaco Possui o fruto vermelho e brilhante. É comestível. - Desconhecido o uso ritualístico.
5. Obì àbàtà = obì gidi – (Cola Acuminata – Sterculiáceae) – Este é um tipo de nóz de cola vermelha que pode possuir de quatro a seis cotilenóides (awé). Típico para oferenda para qualquer Ebora.
6. Àjoòpa é uma nóz de cola doce e vermelha, grande e de qualidade superior.
7. Obì ifin = O mesmo àjoòpa, só que de cor branca. - Oferendado a Obatalá - Muitas vezes é dado como um presente ou como parte de um presente a uma pessoa importante.
8. Gbánjà = górò = awé méji. – (Cola Nitida – Sterculiáceae) – É vermelho e possui apenas dois segmentos como indica um de seus nomes (awé méji). Contém muita cafeína e por este motivo, se comido à noite, provoca insônia. A cafeína age como estimulante e excitante muscular. Combate a depressão e a hipertensão e sua ação rápida é também de curto efeito. Não serve de oferenda Òrìsá.


LENDA DO OBI  (NOZ DE COLA)

"Era uma vez um belo rapaz, forte e saudável, cujo nome era Obi, seu trabalho era levar os recados dos homens, para os Òrìsás. Toda vez que um homem precisava fazer uma oferenda a uma divindade, ele deveria falar no ouvido de Obi todas as suas orações, pedidos e lamentações, e este, por sua vez, transmitiria os recados e traria uma resposta daquela divindade.
Com o tempo, Obi passou a ser mais requisitado pelos seus trabalhos, pois com sua ajuda tudo se tornara mais fácil, a resposta era imediata. Isso foi fazendo com que Obi ficasse muito orgulhoso e envaidecido, passando a cobrar preços cada vez mais altos pelos seus serviços, acumulando assim, muitas riquezas.
Obi sentia-se livre para agir desta forma, andava pelas ruas sem falsa modéstia, dizendo o quanto as pessoas precisavam de seus favores. O tempo foi passando e a situação chegou a tal ponto, que Exu ficou incomodado com as atitudes de Obi. Esù, que caminha entre o céu e a terra com muita facilidade, foi falar com Olodùmàré (o Deus Supremo), relatando tudo o que estava acontecendo na terra, especialmente o comportamento de Obi.
Olodùmàré ficou muito triste com o que Obi estava fazendo e tomou uma decisão, ir pessoalmente a casa de Obi, falar com ele, e ver quais seriam seus argumentos. O Deus Supremo, que nunca havia saído do céu anteriormente, seguiu em direção a casa de Obi, lá chegando, bateu na porta, e Obi foi atender, sem imaginar quem poderia estar do lado de fora, ao abrir a porta, tão grande foi seu susto, que caiu de costas no chão imobilizado, foi quando Olodùmàré disse a ele:
"Tanto foi o teu orgulho e vaidade que vim pessoalmente a sua casa para falar de minha tristeza, como reparação de seus erros, a partir de hoje nunca mais falará de pé, toda vez alguém precisar de teu trabalho é no chão que deverá te invocar, esse será o teu castigo para sempre".
E até hoje é assim que consultamos Obi, no chão. Sabemos toda lenda serve para nos transmitir uma mensagem filosófica.

Outro Ìtán:
"Olodùmàré chama os homens para retornarem ao seu lar, porém nem mesmo a morte é capaz de apagar as lembranças os feitos de grandes homens.
Obi é um elemento muito importante no culto de Vodun, Òrìsá e Nkise. A noz de cola, Obi, é o símbolo da oração no céu.
É um alimento básico, e toda vez que é oferecido, o seu consumo é sempre precedido por preces.
Foi Orunmila quem revelou como a noz de cola foi criada.
Quando Olodùmàré descobriu que as divindades estavam lutando umas contra as outras, antes de ficar claro que Esù era o responsável por isso, Ele decidiu convidar as quatro mais moderadas divindades (Paz, a Prosperidade, a Concórdia e Aiye, a única divindade feminina presente), para entrarem em acordo sobre a situação.
Eles deliberaram longamente sobre o motivo de os mais jovens não mais respeitarem os mais velhos, como ordenado pelo Deus Supremo.
Todos começaram então a rezar pelo retorno da unanimidade e equilíbrio. Enquanto estavam rezando pela restauração da harmonia, Olodunmare abriu e fechou sua mão direita apanhando o ar.
Em seguida abriu e fechou sua mão esquerda, de novo apanhando o ar.
Após isso, Ele foi para fora, mantendo suas mãos fechadas e plantou o conteúdo das duas mãos no chão.
Suas mãos haviam apanhado no ar as orações e Ele as plantou. No dia seguinte, uma árvore havia crescido no lugar onde Deus havia plantado as orações que Ele apanhara no ar.
Ela rapidamente cresceu, floresceu e deu frutos.
Quando as frutas amadureceram para colheita, começaram a cair no solo.
Aiye pegou-as e as levou para Olodùmàré, e Ele disse a ela para que fosse e preparasse as frutas do jeito que mais lhe agradasse.
Primeiro, ela tostou as frutas, e elas mudaram sua textura, o que as deixou com gosto ruim.
No outro dia, Ela pegou mais frutas e as cozinhou, e elas mudaram de cor e não podiam ser comidas. Enquanto isso, outros foram fazendo tentativas, no entanto todas foram mal sucedidas.
Foram então até Olodùmàré para dizer que a missão de descobrir como preparar as nozes era impossível.
Quando ninguém sabia o que fazer, Elenini, a divindade do Obstáculo, se apresentou como voluntária para guardar as frutas.
Todas as frutas colhidas foram então dadas a ela. Elenini então partiu a cápsula, limpou e lavou as nozes e as guardou com as folhas para que ficassem frescas por quatorze dias.
Depois, ela começou a comer as nozes cruas.
Ela esperou mais quatorze dias e depois disso percebeu que as nozes estavam vigorosas e frescas.
Após isso, ela levou as frutas para Olodùmàré e disse a todos que o produto das preces, Obi, podia ser ingerido crú sem nenhum perigo.
Deus então decretou que, já que tinha sido Elenini, a mais velha divindade em sua casa quem conseguiu descodificar o segredo do produto das orações, as nozes deveriam ser dali por diante, não somente um alimento do céu, mas também, onde fossem apresentadas, deveriam ser sempre oferecidas primeiro ao mais velho sentado no meio do grupo, e seu consumo deveria ser sempre precedido por preces.
Olodùmàré também proclamou que, como um símbolo da prece, a árvore somente cresceria em lugares onde as pessoas respeitassem os mais velhos.
Naquela reunião do Conselho Divino, a primeira noz de cola foi partida pelo Próprio Olodùmàré e tinha duas peças.
Ele pegou uma e deu a outra para Elenini, a mais antiga divindade presente. A próxima noz de cola tinha três peças, as quais representavam as três divindades masculinas que disseram as orações que fizeram nascer a árvore da noz de cola.
A próxima tinha quatro peças e incluía assim Aiye, a única mulher que estava presente na cerimônia.
A próxima tinha cinco peças e incluiu Òrìsá-Nlá.
A próxima tinha seis peças representando a harmonia, o desejo das orações divinas.
A noz de cola com seis peças foi então dividida e distribuída entre todos no Conselho.
Aiye então levou a noz de cola para a Terra, onde sua presença é marcada por preces e onde ela só germina e floresce em comunidades humanas onde existe respeito pelos mais velhos, pelos ancestrais e onde a tradição é glorificada."

Em terra yorubás,é costume oferecer OBI a alguém em sinal de cortesia, de amizade, de cordialidade... Repartido, constitui um pacto de lealdade e de comunhão entre as partes.

fonte:http://ocandomble.wordpress.com
Fonte: Comunidade de estudos de Tradição Africana de Orisá
Fonte: http://suamidosun.blogspot.com
Fonte:http://odemutaloia.blogspot.com

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

A Cadeira no Candomblé



O trono ou a cadeira do pai ou da mãe-de-santo, que se confunde com a cadeira de seu orixá, é símbolo máximo de poder no Candomblé. Mais que isso, símbolo sagrado, diante do qual os filhos se prostram, em cumprimento e respeito. Um pai ou mãe-de-santo, quando é confirmado no cargo, isto é, entronizado, é sentado na cadeira, como os reis e rainhas.

A cadeira é o trono do terreiro, de onde a mãe ou o pai-de-santo governam com poderes absolutos.

Depois da cadeira da Ialorixá, há as cadeiras dos oloiês, os ebômis (iniciado seniores) que têm cargo no terreiro. A confirmação de qualquer um desses cargos se faz numa cerimônia pública em que o novo oloiê é sentado em sua cadeira sob aplausos dos presentes. Assim, sentam-se os ogãs, as equédis e outras autoridades. É freqüente, no caso de cargos de não rodantes, o novo dono de cadeira ser conduzido a esta pelo orixá (incorporado em transe) a quem ele deve servir. Quando alguém vai ser confirmado num cargo, faz parte do enxoval uma cadeira, na qual terá o direito de sempre se sentar no barracão. Não é incomum ganhar a cadeira de presente de amigos e irmãos-de-santo. A cadeira de cada um é individual em tudo, de modo que nos terreiros pode coexistir uma profusão de cadeiras de tudo quanto é forma, material e acabamento. Como o espaço do barracão é essencial para as danças, muitos terreiros preferem recolher as cadeiras de cargo e manter apenas algumas delas para que os ebômis possam se sentar.

Somente a mãe-de-santo e seus auxiliares de grau sênior têm cadeira e podem se sentar. Os iaôs (juniores) e os abiãs (aspirantes) sentam-se no chão ou em esteiras. Sentar-se em cadeira é sinal de hierarquia, alta dignidade, obrigações cumpridas.

Os orixás de ebômis também se sentam em cadeiras, mas os orixás dos que estão nos pontos iniciais da carreira sacerdotal sentam-se em banquinhos. A cadeira marca a diferença de tempo de iniciação, de tempo de santo, tanto para os humanos quanto para os deuses.

Esse costume vem da África, onde somente os reis e membros da alta corte podiam se sentar em cadeiras e bancos. O assento do rei deveria ser mais alto do que os dos demais, como se observa até hoje no Candomblé. Mas seu uso é mais generalizado, podendo ser observado como prática que vai desde os povos mais antigos até instituições do mundo ocidental moderno.

O professor da antiga universidade dispunha de sua cadeira, sua cátedra, em latim, daí o nome de professor catedrático, o dono da cátedra. Da cátedra ele ditava sua sabedoria, daí se dizer que “falava de cátedra”. Até hoje se conserva esse costume com relação ao papa: diz-se que o papa fala de cátedra, da cátedra de São Pedro, e portanto o que ele diz e escreve é verdade que não pode ser contestada. Falar de cátedra significa falar com todo o poder do conhecimento, conhecimento conferido pelo estudo, pela antiguidade ou por força do mundo sobrenatural.

Como o Papa, os Bispos também se sentam em cadeiras. A catedral é a igreja em que se localiza a cadeira do Bispo, o trono episcopal. É dali que o Bispo dirige sua diocese.

Além de roupas especiais, como túnicas, capas, togas etc. etc., reis e rainhas, bispos, inclusive o papa (que é o bispo de Roma), pais e mães-de-santo usam muitos emblemas do seu poder: a cadeira ou trono em que se senta; coroas, mitras e adês com que cobrem a cabeça; cetros, báculos e opás que levam nas mãos. Objetos carregados de tradição, simbologia e força mágica. Até a reforma universitária, nas décadas de 1960 e 1970, os professores catedráticos também usavam na cabeça o capelo, símbolo dos doutores. Mas a cadeira ou trono é o símbolo máximo, pois marca o lugar de onde fala a autoridade, o ponto mais alto da assembléia, o centro do universo, o lugar do poder e da autoridade religiosa

Com a morte desses donos do poder, abre-se a disputa pela cadeira, o cargo deve ser preenchido. Cada instituição tem seu modo próprio de fazer a sucessão. No Candomblé, diz-se que quem escolhe o novo chefe do terreiro é o orixá dono da casa, mas há diversas tradições, inclusive entre os terreiros mais antigos.

Com a cadeira principal vaga, abre-se quase sempre uma guerra sucessória. Na sucessão, é importante o critério de senioridade dos candidatos, seu grau iniciático, seu nível de conhecimento sacerdotal. Mas isso não é suficiente. O resultado da escolha depende da tradição sucessória da casa, do jogo político das facções, de pessoas e grupos que pleiteiam o trono da ialorixá, da situação jurídica do terreiro, da sucessão civil sobre o espólio material, isto é, a propriedade imobiliária do terreiro, da posição assumida por possíveis herdeiros legais, que podem fazer parte ou não do grupo de culto etc. Em geral, as casas não sobrevivem ao seu fundador, exceto em meia dúzia de casos, em que vários fatores confluíram no sentido de manter uma tradição publicamente atribuída e reconhecida pelo mundo fora do terreiro, como a mídia e a academia. Mas sempre haverá discordâncias, atritos, rupturas e provável formação de novas casas pelos dissidentes que se afastam. Tem sido assim desde que o Candomblé é Candomblé.

Dos velhos terreiros da Bahia, poucos sobreviveram, mas mesmo assim passando por difíceis períodos de transição. Os terreiros do Gantois e do Axé Opô Afonjá nasceram nessas circunstâncias, originários da Casa Branca do Engenho Velho, que é a grande matriz cultural do Candomblé, fundado em meados do século passado e considerado o primeiro da nação queto.

Em alguns terreiros, a sucessão se faz preferencialmente em linha familiar de sangue, geralmente de mulher para mulher. Em outros, a nova mãe ou novo pai-de-santo é escolhido entre membros da alta hierarquia da casa, independente de laços de sangue.

O Candomblé do Gantois sempre foi dirigido por mulheres descendentes da fundadora, Maria Júlia da Conceição Nazaré. Está hoje no seu quinto governo, com Mãe Carmen, filha carnal de Mãe Menininha, Escolástica Maria de Nazaré, a mais famosa e venerada ialorixá de todos os tempos, e irmã de Mãe Cleuza, que sucedeu Menininha. Menininha foi mãe-de-santo por mais de meio século, tendo sucedido Mãe Pulquéria, sua tia-avó e filha da fundadora. Menininha herdou da tia tanto a propriedade civil do templo, como o cargo de mãe, como ela gostava de deixar bem claro. Maria Júlia, a fundadora, fazia parte da Casa Branca do Engenho Velho, que abandonou quando perdeu a disputa na sucessão. Apesar de se resolver tudo em família, a recente sucessão deixou muitas cicatrizes e muitos descontentes, que preferiam que assumisse a cadeira do Gantois uma filha de Mãe Cleuza.

O Axé Opô Afonjá foi fundado por Mãe Aninha, que também deixou a Casa Branca do Engenho Velho quando seu trono foi conquistado por outra pretendente. Sua terceira mãe foi Senhora de Oxum e hoje é governado pela sua quinta ialorixá, Mãe Stella de Oxóssi. Três importantes mães na história do Candomblé. Mas a segunda ialorixá, Mãe Bada, e a quarta, Mãe Ondina, marcaram apenas períodos de interregno de grandes disputas internas. Com a posse de Mãe Stella, quando o terreiro já se adaptara à ausência de Senhora, houve novas divisões, tendo Mestre Didi, filho carnal de Mãe Senhora, deixado o axé de sua mãe. No Axé Opô Afonjá a sucessão nunca foi por linha de sangue.

No Recife, dos terreiros centenários sobreviveu apenas o Sítio de Pai Adão, porém com grandes períodos de conflitos e decadência, acarretados pelo processo de sucessão do chefe, conflitos que se arrastam até hoje, quando é chefiado por Manuel Papai, neto carnal de Pai Adão, que sucedeu o pai e um dos tios, os quais passaram a vida em disputa entre si e com outros irmãos.

Em São Paulo, quando morreu Pai Caio de Xangô, o fundador do Aché Ilê Obá, subiu ao trono sua sobrinha Mãe Sílvia de Oxalá. Para evitar a partilha da rica propriedade do terreiro entre os herdeiros civis de Caio Aranha e o conseqüente fim do Aché Ilê Obá, Mãe Sílvia conseguiu promover o tombamento de seu terreiro pelo Condephaat, em 1990, embora o templo não pudesse ostentar, nem de longe, uma história de tradições nos moldes das casas da Bahia. O terreiro foi fundado apenas em 1974 e a própria nova mãe-de-santo tinha poucos anos de iniciada quando assumiu o cargo de ialorixá, nem era ebômi. O tombamento por um órgão oficial de preservação de tradições criou um inusitado mecanismo de legitimação no Candomblé paulista.

Escolhido o sucessor ou sucessora que guiará os destinos do terreiro, deve-se providenciar imediatamente uma cadeira nova em que se sentará o novo titular do posto mais alto da casa. A cadeira do falecido será guardada em ambiente sagrado para reverências eventuais, ou recolhida ao museu da casa, onde poderá ser apreciada pelos curiosos e interessados, como ocorre no Axé Opô Afonjá de Salvador e em outras casas tradicionais. Rei morto, rei posto. Uma nova cadeira será o centro do novo poder.


Bibliografia:

Braga, Júlio. A cadeira de ogã. Rio de Janeiro, Pallas, 1995.

Prandi, Reginaldo. Os Candomblés de São Paulo. São Paulo, Hucitec, 1991.




Palestra Mensal no Jardim Botânico


Palestra inicial "O uso das Folhas nas religiões Afro-descendentes" do Seminário Olhares e Saberes Diversos. O ciclo de seminários ocorrerá sempre na última Quinta-feira de cada mês.

Local: Auditório da Coleção de Plantas medicinais - 
Rua Pacheco Leão, nº 915
Inscrição: (21) 2294-6590
Coordenação Yara Britto e Angela Porto 
Instituto de Pesquisas Jardim Botanico do Rio de Janeiro 

Fotos do evento de 26/01/2012:
 
Palestrante Emanoel Campos Filho - Ile Axé Ola Ynká
Ogan Jaçanã Cardoso






Plenária